segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Afinal havia outra

Neste momento Portugal vai assistir a uma nova vaga de cortes da despesa e, eventualmente, aumento de impostos. O PS bem pode berrar em desacordo, mas se tivesse um líder e dirigentes à altura comportar-se-ia de outra maneira. Só prova que a realidade ainda não chegou totalmente onde ela é mais necessária, à classe política. O mesmo, aliás, parece que se passa no CDS e no PSD.
Ainda há quem não perceba bem que há demasiadas diferenças entre o que levou a esta intervenção externa e as duas anteriores, aquelas duas em que o Sr. Mário Soares esteve tão à altura de resolver tanto quanto não quer perceber ainda o que se passa agora com esta. Impressionante a perversidade da lógica partidária no atropelo à razão desde que isso possa dar ao clube partidário de que se faz parte um livre-trânsito de acesso ao poder, ainda que a prazo.
Por vezes questiono-me se a maior parte do CDS sabia ao que ia quando se colocou em bicos de pés para ir para o poder. No congresso de Viseu ficou bem demonstrado aquilo que o CDS sabe tão bem fazer: dar umas bordoadas no PSD ao mesmo tempo que se põe a jeito para ir para o poder pela mão do mesmo PSD. Discutir nesse congresso sobre a pertinência política de participar num governo de fecho de ciclo político iniciado em 25 de Abril, de entender que o que se está a encerrar é o modelo socialista que dura desde essa altura, de perceber que a governação não seria substancialmente diferente se a equipa fosse PSD/CDS ou PSD/PS, nada disto importava discutir. Somente interessava ir para o poder. Considerandos que colocassem em causa esta (i)lógica partidária deveriam ser considerados como impertinências de quem “não percebe porque é que se frequentam os partidos”.
Parece agora evidente que muitas pessoas no CDS descobriram que o jogo afinal é bem mais duro e prolongado no tempo do que seria desejável. Que o primeiro-ministro não anda a colaborar como deveria, pois como está bem de ver a personagem resolveu não ter uma agenda eleitoralista e por isso vai ignorando a lógica partidária que se convencionou idolatrar, a sagrada gestão do ciclo eleitoral. Que afinal a crise é realmente diferente da crise de 1983/1985, bem mais profunda, pois trata-se de passar de um modelo de economia de consumo e endividamento para um modelo de economia voltada para a exportação e com maior proporção de capitais próprios. E isto demora muito tempo, coisa para uns 20 a 30 anos. Desculpem a inconveniência temporal que tanto deve atormentar o incrédulo, mas jogar no campeonato da globalização é mais puxado do que jogar no campeonato do mercado interno, e durante o tempo (perdido) em que nos entretemos a vender automóveis, a construir casas, a endividarmo-nos a todos os níveis, etc, outros houve que se entreteram a ocupar e consolidar posições no mercado internacional.
Já aqui o disse que o Sr. Paulo Portas é dos raros políticos que possui discernimento sobre Portugal. E que sabia que o jogo ia ser duro. Mas vai dando sinais de talvez não ter percebido bem o grau da austeridade necessária pela nossa triste circunstância. Posso estar enganado, ou talvez não. Veremos quando a batata quente cair no Ministério tutelado pelo Sr. Mota Soares, o que aliás vai seguir dentro de momentos.
É provável que muitos no CDS possam andar a dizer ao espelho “afinal havia outra”, tal o seu desconhecimento sobre a natureza e dimensão do ajustamento que fatalmente há que levar a cabo. Resta saber se o Sr. Paulo Portas e o Sr. Mota Soares dirão o mesmo um ao outro no futuro próximo, e com isso nos conduzam a uma crise política. Da minha parte exijo que não, pois ambos quiseram ir de mão dada com o PSD para o governo. E é bom lembrar que não vale desistir a meio do campeonato e atirar pedras ao primeiro-ministro. E já agora lembro também que o autor deste texto defendeu que o governo deveria ser PSD/PS pois o ciclo que se está a encerrar foi o criado por estes dois partidos e a natureza da austeridade em curso pouco dependeria do partido minoritário da coligação, sem contar que o poder dos credores é imenso. Mas uma vez que se lá está por opção própria, então é para estar de corpo e alma, e se acaso o corpo parece desencontrado da atormentada e fugidia alma, então que se ginastique o que houver para ginasticar de modo a que a alma vá ter de volta com o corpo e não o seu contrário, e com isso se leve a legislatura até ao fim. É a vida.
Nota final: em cenários de emergência, como aquele em que vivemos, o poder fica, por natureza, muito concentrado no primeiro-ministro e no ministro das finanças. Nessa circunstância, e quando em coligação, o partido mais pequeno tende a ter um peso inferior àquele que teria se a proporcionalidade dos votos fosse o único critério na aferição do poder. Que se interiorize bem que o número 2 é mesmo o ministro das finanças.

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