quinta-feira, 29 de setembro de 2016

Mariana


A desigualdade está cada vez mais na ordem do dia. Mariana Mortágua, em conferência socialista, trouxe novamente o tema à tona. Segundo Mariana, filha de Camilo, a culpa é do sistema. O capitalismo está desenhado assim e por isso o estado social ajuda a mitigar o problema, mas não o resolve na base. Assim sendo, Mariana deixa dois conselhos ao PS. O primeiro tem sido sobejamente divulgado: perder a vergonha de “ir buscar” dinheiro a quem está a acumular. As aspas são minhas. O segundo: pensar até onde está o PS disposto a ir para encontrar uma alternativa ao sistema capitalista. E esta é a questão que importa resolver.

É mais ou menos consensual nas democracias liberais, que alguma redistribuição de riqueza é necessária para reduzir desigualdades. O debate normalmente passa por definir até onde deve ir essa redistribuição. Mas Mariana quer uma alternativa, Mariana quer mandar a casa abaixo e construir tudo de novo. É sempre esse o problema da esquerda revolucionária: achar que existe um futuro ideal, que só a própria esquerda conhece e pode construir. Mas antes: sangue, vingança e nenhum problema de consciência, pois o fim político legitima o crime.

O que Mariana despreza é que a desigualdade não é tanto um problema (moral ou económico) como é a pobreza. O cidadão médio tem menos dinheiro do que a celebridade do momento, mas o verdadeiro problema não está em comparar um rendimento mais ou menos suficiente, mais ou menos burguês, com um rendimento extravagante. O problema está na pobreza extrema, no simples facto de existir quem não tenha nada.  A ironia disto tudo é que não existe sistema no mundo que tenha contribuído mais do que o capitalismo para a redução de pobreza.

Os dados do Banco Mundial apresentam uma tendência clara. A percentagem de pessoas no mundo a viver em condições de pobreza extrema era 85% em 1800. Hoje em dia essa percentagem é de 12%, sendo que estamos precisamente agora no período mais acelerado de redução de pobreza. O desafio é grande, mas parece de alguma forma possível e estes resultados não são certamente mérito do comunismo, nem do socialismo bolivariano da Venezuela, que o Bloco de Esquerda tanto apoia. Foi o capitalismo que nos trouxe aqui. Existem problemas por resolver? Com certeza e não são poucos. Eu também acredito num mundo melhor, mas ao contrário de Mariana, filha de Camilo, acho que devemos manter a estrutura da casa e reparar apenas o que precisa de reparo.

segunda-feira, 4 de julho de 2016

Geringonça


Raramente um organismo político terá sido tão bem apelidado quanto o actual (des)governo de Portugal. Contém tudo aquilo que caracteriza as organizações mais debilitadas. Começa por ter um chefe de banda fraco, perdedor, oportunista, e chico esperto. Não por acaso não tem um pingo de vergonha em colocar os interesses pessoais e do grupo a que pertence acima do interesse do país, atirando-se de braços abertos para uma aliança torpe e negativa com partidos não democráticos a troco do poder, numa demonstração despudorada de como a mera gestão de contactos e o mexer de cordelinhos entre seitas de interesses é tido como a forma natural de condução de vida. Sendo o espelho perfeito daquele Portugal dos pendurados, que vai desde alguns bancários, políticos, empresários, a sindicatos, e que reinou desde 1990 até 2011, o Sr. Costa simboliza o falhanço de um regime que já faleceu, e que deixou como legado um monte de dívida, outros fardos, e acima de tudo uma enorme crise de valores. E se existência dos dois primeiros legados ainda lhe vai limitando a acção, para bem da Nação, infelizmente o terceiro legado é de uma natureza tal que dificilmente se pode combater, sendo assim o terreno mais exposto para se praticarem patifarias, como o que se passa com a educação ou ainda os temas dito fracturantes, moedinha de troca com as outras forças arcaicas e infantis que suportam o (des)governo. 

A Geringonça traz ainda associada o pior que os partidos políticos têm para oferecer (parece agora que unicamente). Agremiações de gente pouco recomendável, embora esperta, que se serve dos partidos para dar largas ao seus projectozinhos pessoais à boleia de ilusões com que encharcam a população. O PS, que navega em inconsciência dado o pavor com que observa a evolução do PASOK e PSOE, anda a tratar da sua sobrevivência e dos seus. O PCP, que perdeu o comboio da vida, trata de distribuir o máximo de amendoins pelos deserdados da vida. O BE, produto cosmopolita e diletante da sociedade abundante e infantil em que nos tornámos, trata dos dislates que amiúde assaltam aqueles seres desequilibrados que a tudo se permitem e que nada dão em troca.

Felizmente esta geringonça não tem todo o espaço de manobra já que as instituições europeias vão servindo de travão a este ninho de cucos. Explica-se assim o anti europeísmo que a vai invadindo. E se o PS se anda a comportar como um simplório e péssimo parceiro do grupo a que diz querer pertencer, e a quem pediu a pertença (convirá nunca esquecer), já o PCP somente quer sair da EU e da zona Euro. Percebe-se. Estas são as últimas fronteiras que faltam cruzar para ousarem sonhar um dia poderem brincar às revoluções. O BE, mais infantil, ainda sonha que a EU pode sobreviver na base de um contracto onde uns viverão eternamente pendurados noutros. Por mim confesso, que bom estarmos na EU e na zona Euro. Imaginemos por um instante estes perfis com capacidade para imprimir moeda e com liberdade total para produzir de défices a seu belo prazer para as suas engenharias sociais. Um pavor. Obrigado Europa.

É nesta infantilidade amalucada que o governo de Portugal vai andando, como uma turba apática que marcha impassível para o desastre e insensível às consequências que aí vêm. Uns porque se acham muito mais do que são, outros porque pensam que podem mudar o mundo por decreto e ao virar da esquina. Estamos naquele ponto tão bem descrito por Goethe: “Nada mais temível que ver pessoas incapazes e vulgares associadas a outras de tendências visionárias”. 

Nota final. Os geringonços adoram dizer que a direita está ressabiada. Uma correcção, a direita não está ressabiada. A direita está assustada, e com fundados motivos para isso, coisa aliás que o país um dia perceberá porquê. Esta interpretação errónea tem uma explicação simples. O ressabiamento é o estado natural da esquerda em geral, e dos bloquistas e comunistas em particular. Afinal o mundo e a natureza humana não é como eles julgam que deveria ser, e por terem uma tremenda dificuldade em passar a sua suposta “superior” mensagem nos regimes democráticos, vivem naquele desespero dos que andam desencontrados com a realidade e que mais não é que o terreno fértil para a produção de ressabiamento. Por terem momentaneamente a faca e o queijo na mão olham agora a direita com o mesmo sentimento com que sempre se olharam ao espelho. Somente.

domingo, 1 de maio de 2016

Uber: concorrência e escolha


fotografia uber


Portugal é um país fantástico onde os táxis são particularmente maus e os ubers particularmente bons. Antes de entrarmos num táxi não sabemos muito bem o que vai acontecer: às vezes o serviço é razoável, outras vezes é grosseiro, rude e cheira mal. Quando entramos num uber a temperatura ambiente é ajustada com todo o obséquio ao nosso agrado – e mal sabíamos nós das maravilhas da temperatura ambiente. Este jogo das diferenças entre táxis e ubers é demasiado simples para ser verdade. Por norma, os táxis não são assim tão maus e os ubers não são assim tão bons. Mas somos um país fantástico e por isso absolutamente sintomático do que está em causa nesta disputa: a nossa liberdade.

O sector dos táxis, protegido pelo estado, nunca teve incentivo a prestar um melhor serviço nem a adaptar-se aos tempos. Mas os tempos permitiram à Uber contornar este proteccionismo. A disrupção digital, no fundo, permitiu à Uber operar como se o mercado fosse livre, aparecendo com melhores preços e um serviço melhor. Mas este nosso país oferece ainda uma maravilha particular: a reacção do governo, ou seja, atirar dinheiro do contribuinte para cima do problema. A receita socialista traduz-se em 17 milhões para modernizar um sector que o próprio governo não deixou modernizar.

Este é um exemplo claro de alguns dos principais problemas da regulamentação excessiva e intervenção do estado na economia. A primeira consequência que vemos é um bloqueio à inovação e ao progresso. A segunda é subida de impostos e dívida pública como tentativa de resolver o problema através de gastos públicos. E o pior é que o dinheiro é simplesmente gasto: ou alguém acredita que os taxistas vão subitamente comprar bons modos e aparecer com um serviço tecnológico topo de gama?

As soluções que um estado socialista procura para os problemas que cria seriam naturalmente dadas pelo mercado livre. É preciso alguma regulamentação, é certo, mas se calhar vale a pena repensar até onde deve ir o papel do estado. Ao impedir concorrência e escolha, o estado contribui directamente para preços mais altos e pior serviço. E talvez mais grave ainda: retira liberdade de escolha aos consumidores. A liberdade, para estes intelectuais do conhecimento centralizado, é apenas um conceito teórico.