Ilustres deputados socialistas. Acaso não tenham reparado, encontram-se alguns dos senhores em excelente posição para iniciar a empreitada mais complicada de ser executada em Portugal: fazer chegar o ajustamento aos partidos.
Há cerca de
6 anos tomei consciência que deveria começar a dar um qualquer contributo
político a Portugal. Tornara-se para mim evidente que derivado de muitos
portugueses de valor terem-se abstido de participar na política terá conduzido
que os partidos fossem tomados de assalto por indivíduos de competências
insuficientes e de perfil menos recomendável. Esta situação não é um exclusivo
de nenhum partido em particular, implicando-nos portanto a todos na prossecução
dos necessários ajustamentos a levar a cabo nos partidos na medida das nossas
possibilidades, e sempre que as circunstâncias o permitam.
Permite-me
caro deputado socialista que doravante conduza a carta de uma forma frontal e
directa e utilize o “tu”. Não em obediência de um qualquer estratagema
argumentativo perverso pelo “tu” ser mais frequente na esquerda e com isso
ardilosamente te querer conquistar. Simplesmente pretendo numa linguagem
simples e despretensiosa confrontar-te com o facto de que o combate em curso é
menos o de esquerda versus direita e mais entre os que estão na política com
princípios e carácter e aqueles que utilizam a política para se nutrir a si e
ao seu séquito.
Sabemos os
dois que as consecutivas asneiras que nos levaram ao resgate de 2011 não foram
da exclusiva responsabilidade do PS, ainda que tal afirmação vá ao arrepio de
muitos responsáveis do PSD e do CDS. É evidente que as asneiras vêm sendo
praticadas há muito (pelo menos 25 anos) como resultado de governos sem visão e
prisioneiros de toda a sorte de grupos de pressão, desde empresários, grupos
profissionais, sindicatos, etc., todos alinhados, ainda que inconscientemente,
num despropósito de acção sem rumo e de méritos duvidosos. Podemos discutir o
grau de responsabilidade de cada um até à exaustão, mas esse não é o exercício
que te proponho. Como também deves saber, e à semelhança das asneiras que com
frequência fazemos com a nossa saúde individual, as correções aos desvios
pagam-se com ajustamentos, coisa sempre dolorosa, e, obviamente, nunca bem
acolhida. Infelizmente em democracia temos vasta experiência disto. Que o diga
Mário Soares que galhardamente vestiu a pele de quem teve de se chegar à frente
nos dois ajustamentos anteriores.
Acontece porém
que este último ajustamento tem uma particularidade diferente dos dois
anteriores. Enquanto os primeiros foram ajustamentos meramente financeiros,
este último ajustamento é também económico (trazer de volta os tais
transacionáveis e com isso equilibrar a balança corrente) e político. Como
sabes a questão financeira e económica vai-se resolvendo. Está a sê-lo, e vai
continuar a sê-lo (coisa que tu também sabes), embora não na velocidade que
desejaríamos. Mas como somos pessoas de juízo, sabemos que embora nos dias de
hoje se queira tudo já (compre já, faça já, etc), não existe propriamente um “ajustamento
já”. Por isso, somos ambos obrigados a lidar com o factor tempo, o que até não
é complicado, pois requer simplesmente uma dose mínima de paciência. Quanto à
última parcela do ajustamento, o ajustamento político, acredito não ser fácil
convencer-te que nos encontramos precisamente no mesmo barco e que todos nós
temos um desafio semelhante a tratar nos nossos partidos. Parece estranho e
pode soar a falacioso, mas neste ponto temos muito em comum, pois é
incontornável que qualquer análise mais fina aos nossos partidos não resiste à
conclusão de que todos necessitamos de fazer ajustamentos.
Assim, para
o que te convido caro deputado socialista, é em alinhares comigo na parcela do
ajustamento que falta fazer e com isso completarmos em parceria o ajustamento
total de Portugal. Está bem de ver que este ajustamento dos partidos políticos
será complexo e doloroso, mas terá fatalmente de ocorrer. Não ocorrerá ao mesmo
tempo para todos os partidos. Não ocorrerá na circunstância que desejamos. Não
ocorrerá no momento mais conveniente. Penalizará no curto prazo quem iniciar a
empreitada, mas brindará mais lá para a frente quem der o pontapé de saída. Haja
para isso liderança capaz.
Caro
socialista, é hoje muito claro não teres o líder de que precisas, por isso
evita que as doçuras com que te acenam te impeça de tomares na tua mão as tuas
responsabilidades e o futuro do teu partido. Sim, sujeitar-te-ás a algum
escárnio de alguns colegas se fores avante com o processo e muitos adversários cantarão
de alto vitória. Mas isso é a natureza humana em ação pois que as almas
pequenas andam por todo o lado. Mas não te preocupes em demasia, os dividendos
brindam amiúde o audaz e quem não deixa escapar a oportunidade, ao que não será
alheia a expressão “Ri melhor quem ri por último”. Como português considero
pernicioso a defesa obsessiva da dama política que cada um representa, no meu
caso o CDS. Da minha parte julgo ser prioritário servir Portugal, a dama de
todos nós, e claramente neste momento Portugal ficará melhor servido se mudares
não só a tua liderança como também o estilo que recentemente adoptaste. Como
deves calcular não me anima a perspectiva da esquerda radical crescer à tua
conta. Quero mais é que tu cresças à conta deles, ainda que isso implique que
me inflijas derrotas no futuro. Óbvio, não é?
Calculo que
como pessoa atenta que és deverás ter tido a oportunidade de ler nos últimos
anos alguns portugueses que tiveram a vontade de escrever sobre Portugal. Pensa
em Camilo Lourenço, Ferreira do Amaral, Medina Carreira, João César das Neves,
João Gomes Ferreira, e Henrique Neto (já agora, um excelente candidato a PR,
com sólida noção de Estratégia e que percebe bem o que Sines pode significar;
queres debater sobre estas matérias?). Todos eles não foram particularmente
meigos e abonatórios com os partidos, o que, aliás, vai de encontro ao
sentimento geral dos portugueses de todos os quadrantes. É do senso comum desde
há uns anos a esta parte que existe algo de perverso nos partidos políticos que
faz com que ocorram situações extremamente bizarras e nada benéficas para a
nossa saúde democrática, com reflexos directos no nosso bem-estar material e
espiritual. O resgate de 2011 e os casos nas mãos da justiça são disso bom
exemplo. Mas não é minha intenção provar-te o que tu já sabes. Antes, é minha
intenção neste momento lembrar-te que, embora reconhecendo a delicadeza e
singularidade política da tua circunstância, estás em perfeitas condições de
executar uma boa parte do ajustamento político no teu partido. A situação que o
teu chefe te criou é ímpar e excelente para o propósito. Não sei se do meu lado
vou ter tamanha sorte quando chegar a nossa vez.
Caro
socialista, eu sei que tu podes desconfiar desta missiva. Mas acontece que
querem-nos impingir sermos inimigos quando o que queremos ser é simplesmente
adversários dispostos a debater no muito em que concordamos, ainda que possamos
discordar no grau e na velocidade. Nesta fase é impossível não te convidar a
questionar frontalmente sobre a motivação e o caminho que te quer levar aquele
que sem modéstia jocosamente denegriu a vitória que anteriormente tiveste
quando comparada com o parco resultado agora obtido, qualquer que seja a medida
que utilizes. Não denunciará isto tanto daquilo que ambos temos para ajustar na
política? E o que dizer da argumentação? Nem um sofista de segunda se atreveria
a tanta desfaçatez argumentativa como aquela utilizada pelo teu chefe. Um virar
de página? Que página? A da austeridade? Por favor, poupa-me, ou será que
também acreditas em dietas que te põem a comer doces? Maioria de esquerda? O
que é isso? Mas achas que as palavras “esquerda” e “direita” servem para
arregimentar? Deixas que o significado preconceituoso das palavras condicionem
com quem tu deves caminhar? O que seria o CDS ou o PSD invocarem uma hipotética
maioria de “direita” se para isso se socorressem de um qualquer partido
fascista?! Seria bizarro, não era? E que dizer dos “coitadinhos” eleitores de
segunda? Evidentemente não são de segunda. Mas que jamais se subvertam os
termos da relação. Cada um faça a sua parte. Eles dão os passos, nós estendemos
a mão. Neste ponto alerto-te para o seguinte: os passos quando são de
circunstância não são de fiar.
Sim, 1975
foi há muito e temos de compreender que estamos em 2015. Mas o que seria se se
tratasse de um partido fascista? Aceitaríamos nós o argumento de que os
fascistas de agora já não são como os de antigamente. Humm, meu caro, não
caiamos nessa, pois não? Aliás, como reparaste os sinais estão bem à vista, a
começar pela atalhada e atabalhoada sugestão de uma indigitação apressada do
teu chefe pelo BE e CDU. Este último na busca de todos os possíveis cheques em
brancos, e os dois a quererem PASOKar-te assim que o entenderem. Porque
conhecem a natureza humana e a infeliz circunstância do teu chefe não hesitam
na utilização da cenourinha do poder como engodo para alcançarem os seus
objectivos. Claro que tu intuis tudo isto e que no fim julgas que utilizando um
qualquer esquemazinho cozinhado na ocasião acabarás por sair por cima. Pois eu
aqui permito-me agitar-te a consciência e desde já te digo que é precisamente
neste ponto que erras. O que aliás não é de estranhar, pois é sabido que a
ideia de poder cega-nos e retira-nos discernimento para a tomada de decisão.
Sabes, a
transparência não é o forte dos totalitaristas. Os passos que dão são sempre
subservientes aos seus fins. Sabemos que do lado de lá tudo se permite à
táctica desde que isso sirva a estratégia. Recordo-te uma história que ilustra
o perfil de com quem vais negociando. Durante a guerra fria os alemães fizeram
uma descoberta. Enviaram uma amostra para o Japão, os EUA, e a USSR. Dos
primeiros receberam de volta uma amostra melhorada, dos segundos receberam
propostas de comercialização, e dos terceiros não obtiveram qualquer resposta.
Há coisas que não mudam.
Imagino que
neste ponto do discurso te irrites um pouco e digas para me preocupar mais com
o meu partido. Compreendo. Sei realmente que os telhados de vidro andam por
todo o lado e aqui também há muito para ajustar. Acontece que as possibilidades
não têm sido tão boas quanto aquela que tu agora tens, embora nunca nos
tivéssemos escusado sempre que a oportunidade surge, como em Julho de 2013
quando o AR se fez ouvir alto e a bom som para quem nos quis ouvir. A cena
“irrevogável” e a forma como o anterior ministro da economia e sua equipa foi
destituída em Julho de 2013 em nada nos orgulha. Espantado com a confissão e
com esta simples ingenuidade política? Não estejas, doravante este estilo de estar
na política vai ser premiado. O tempo das ilusões e dos joguinhos políticos
acabou. O campeonato da Globalização não é a feijões e isso implica práctica
política de outro standard.
Caro
socialista, eu sei que não é tanto a voz do CDS que procuras ouvir com esta
singela abertura. Acima de tudo tu precisas é de sinais humildes do partido com
quem directamente te degladias, o PSD. As pressões intermitentes que te possam
chegar para estenderes a passadeira do poder a um partido que coloca Marco
António Costa como porta-voz não devem ser de fácil digestão. Acredita,
acompanho-te no sentimento. Entre outros atributos, os discursos registados no
passado e as palavras e o tom utilizados pela personagem após o discurso do
Presidente da República de dia 22 de Outubro ficarão nos anais da nossa
política como “como não saber fazer as coisas”. Peço-te desculpa, mas como
simples militante do CDS julgo ter pouca margem neste aspecto, embora daqui sugira
uma sabática da pessoa à função, um ocaso político que certamente não deixaria
de transmitir um sinal positivo. Nesta fase é absolutamente imperdoável ter
alguém num lugar de destaque que provavelmente nunca deve ter lido o livrinho
de Dale Carnegie “Como fazer amigos e influenciar pessoas”. Insuportável em
2015 validar o que Manuel Laranjeira escreveu em 1907: “Dentre cinco milhões de criaturas, que se sentem esmagadas por um
mal-estar insuportável, não existem cinco que se entendam para o remediar”.
Como vês há
muito por fazer em todo o lado. Quis a história reservar-te este momento para
fazeres a tua parte aquando da votação do governo da Coligação. Peço-te para
decidires em consciência e como pessoa livre. Diz a tradição que nesta votação
se siga a disciplina interna de voto. Peço-te no entanto que jamais deixes a
tradição à mercê de perfis de políticos egoístas possuidores de agendas
pessoais, de políticos ardilosos que promovem arranjos menos transparentes,
políticos sem escrúpulos que não hesitam em atalhar, e políticos sem um pingo
de modéstia quando não assumem as suas responsabilidades quando confrontados
com resultados eleitorais que ficaram demasiado aquém dos objectivos a que se
propuseram. Uma cumplicidade funesta que te acompanhará para o resto da vida.
Caro
deputado socialista. Como político que és lembra-te do que escreveu o teu
camarada Francisco Assis. Cito “O pior que pode acontecer a um político é ter
receio da solidão”. Assim, com respeito e consideração confronto-te com o que
te desafia. Seguir a opção fácil e cómoda e com isso confirmares-te como um vulgaris elemento de uma manada que se
limita a seguir a conveniência do momento. Ou seguir o caminho da mudança e com
outra liderança dar esperança para o futuro do teu PS como partido charneira.
Há momentos que ficam para a história. Este é um desses.
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