Os Portugueses andam confusos. E com razão. O Governo não explica o motivo
de fundo porque anda a tomar as medidas difíceis e impopulares que vêm sendo
anunciadas. Do pouco que transmite parece que o défice é tomado como o único
critério pelo qual se mede o sucesso ou insucesso do programa de ajustamento.
Como se não existissem outros aspectos da nossa vida económica e financeira que
faltam ser ajustados na economia portuguesa. Neste momento o problema maior do
Portugueses é menos o coercivo ajustamento macro económico em curso e mais a explicação
do que se passou nos últimos 25 anos e da transformação que é imperativa levar
a cabo.
Sabemos que ninguém tem de ser especialista em macro economia, termo que só
por si tem tanto de atraente como de incompreensível. Tanto mais que o mesmo só
aparece quando é necessário proceder a um ajustamento. Mas este facto não
justifica a falta da explicação que é devida aos portugueses. Como se quem
tivesse um cancro e precisasse de sessões de quimioterapia lhe fosse negada a
explicação do tratamento por parte do médico, que aparte de não divulgar a
doença em causa, se limita a dizer que o tratamento é necessário porque é o que
deve ser feito. Naturalmente o doente ficaria confuso por não conseguir avaliar
da bondade da terapia por não conhecer a doença de que padece, revoltado por
não saber se de facto a dita terapia leva a algum lado, e extremamente irritado
pelo incómodo das sessões. Este é o ponto em que encontra Portugal:
voluntariado à força para se submeter a um tratamento do qual desconhece o
objectivo do mesmo, embora conheça os seus sintomas funestos, e para cúmulo ainda
lhe é vedado a explicação do mal de que padece.
Portugal tem um cancro que se não for devidamente tratado pode levar o país
a uma banca rota. Nos últimos 25 anos muitas células desenvolveram-se em
Portugal muito para além do número suportável. E em paralelo muitas outras
foram mortas e que afinal eram essenciais manter. Criámos muitas empresas de
construção civil para produzir muitas coisas para as quais não tínhamos
dinheiro e tão pouco a necessidade. Criámos muitas empresas para vender
automóveis para servir o país de carros para os quais não tinha dinheiro
suficiente para comprar. Criámos muito mais oferta de restauração para servir
pessoas que não tinham dinheiro para os frequentar. Matámos demasiadas empresas
em sectores que não devíamos, e emitimos sinais para criar demasiadas empresas
em sectores onde o tempo provou que não tanta necessidade. Abandonámos os
campos, a pesca, e muitas outras actividades que aprendemos a desdenhar, tal
como o servir os outros (trabalhos domésticos e de limpeza) e trabalhos
relacionados com a construção, preferindo substituirmo-nos por imigrantes
importados de países de Leste e outros.
E embora alguns médicos fossem avisando para o cancro que se estava a
desenvolver (sim, a partir de 1995 muitos economistas já avisavam Portugal do
que se estava a passar), preferimos o caminho da facilidade em coisas tão
básicas como o adquirir formação e em acreditar que tudo ia ser fácil. Negámo-nos
à consciência de tudo o que é necessário para um sistema que permita o
desenvolvimento de células mais fortes, tais como negligenciarmos o sistema de
Justiça e de sermos continuadamente benevolentes para com os aldrabões, coisa
que vai do especialista em não pagar rendas de casa àquele que continuadamente pensa
que pode viver eternamente à sombra do próximo (incluam-se os aparelhistas que
grassam nos partidos políticos).
Negámos a doença e demos-lhe gás para se desenvolver ainda mais. Firmámos
contractos para parcerias público/privadas para adquirir bens no futuro cuja
necessidade não existe e a um preço absurdo, dando aso a que se especule com
muito fundamento sobre um rol enorme de corrupção entre governantes e empresas
privadas. Deixámo-nos embebedar no crédito sem tomar em linha de conta de que o
mesmo deverá ser canalizado primordialmente para a produção e muito menor grau
para o consumo, desvirtuando princípios de equilíbrio básico entre produção e
consumo. E do pouco que ia seguindo para dar gás à produção não foi exigido o
equilíbrio mínimo entre o dinheiro que se pede emprestado e o dinheiro próprio,
habituando-se o empresariado a pensar que o montante a investir tem que vir
todo do capital alheio e não numa relação que deve ser entre 30/70 até 60/40 (e
neste último limite só para casos muito especiais).
Enchemos a célula do Estado com muito mais organizações e institutos disto
e daquilo sem ter em conta a capacidade da Economia privada em suportar esse
crescimento. Como se o Estado fosse o motor da economia. Obrigámos a banca a
preterir o financiamento à economia privada de modo a canalizar o dinheiro para
financiar os défices crescentes das empresas públicas e do défice público.
O que há a fazer é basicamente destruir todas as células a mais que eram
perniciosas e produzir células de que necessitamos. É bom que muitas empresas
de construção e outras associadas a esta actividade vão à falência. É bom que
muitas empresas de vendas de automóveis vão à falência. Seria óptimo que não
tivéssemos tantos professores pois não precisamos de tantos. É bom que muitos
bancos fechem agências. É bom que muitos restaurantes fechem. Seria óptimo
despedir muitos funcionários públicos. A lista poderia continuar. Com a
libertação de muitos recursos das células mortas é possível que outras células
surjam. Em que actividades? Bom, não sou socialista, por isso debito a resposta
que resta. Quem melhor determina as células que devem ser criadas são os
empresários. Acredito que quem cria trabalhos reais, e não trabalhos a fingir,
é o empresariado. E destes, os verdadeiros, não os a fingir como aqueles que se
atiram para a frente com demasiado dinheiro emprestado e pouco do seu bolso. E
à desculpa clássica de que há pouco dinheiro próprio que façam como se faz nos
países mais desenvolvidos: associem-se.
A velocidade com que isto tem que ser feito é o ponto mais sensível da cura
e onde é extremamente difícil dar a resposta certa. O que se sabe é que o
Governo tem que emitir todos os sinais e incentivos para a destruição das
células perniciosas e outros sinais para a criação das células que importam
desenvolver. É do mais elementar bom senso que teremos que nos tornar numa
sociedade exportadora para resolver grande parte dos nossos desequilíbrios.
Neste ponto o consenso é total. É aqui que o Estado tem um papel enorme a fazer:
tomar todas as medidas e mais algumas de modo a que exportemos muito mais. É
aqui que se encontra a luz. É aqui que é preciso comunicar aos portugueses de
que vale a pena fazer o que está a ser feito. Como garantir que estimulamos de
facto as exportações?
Medidas:
1.
A já anunciada
descida da TSU por parte da entidade empregadora em desfavor do trabalhador.
2.
Descer substancialmente
o IRS por contrapartida do aumento do IVA. Há que penalizar o consumo e
estimular a produção. Sem contar que se dá a opção de poupança a quem o
pretenda fazer. Por outro lado estimula-se o mais produtivo.
3.
Redução
acentuada dos custos de contexto, nomeadamente os respeitantes a licenciamentos
e os relacionados com a Justiça e cobranças.
4.
Redução muito
acentuada do imposto sobre os produtos petrolíferos e aumento muito acentuado do
imposto de circulação. Que um compense o outro.
5.
O Estado
pagar a tempo e horas. Não será difícil canalizar o dinheiro que afinal não foi
necessário para capitalizar a banca para este fim. Há que definitivamente por
um ponto final neste trauma nacional.
6.
Plano de redução
do IRC do tipo 1,5 pontos percentuais por ano por um período de 10 anos.
Objectivo final será termos uma taxa de IRC à volta de 10%.
Há que veicular explicitamente e à viva voz que Portugal vai ter de ser
forçosamente uma sociedade exportadora. Só sociedades exportadoras se tornam
sociedades dinâmicas onde o progresso é extensível a uma grande maioria, onde a
meritocracia marca o ritmo e os “penduras” têm menos hipóteses. É nas
sociedades exportadoras que melhor se desenvolvem as virtudes inatas do ser
humano, coisa que não deve fazer temer os portugueses. O mundo é o habitat
natural do português. Portugal é somente o seu lugar de partida. Não há que
temer jogar no tabuleiro da Globalização. É como jogar em casa um jogo de que
fomos pioneiros. O “outro” é coisa para nós muito acessível. Somos campeões no
relacionamento com todos os outros, desde o mais parecido connosco ao mais
diferente. Atiremo-nos à exportação.
Não perceber que temos que exportar muito mais do que importamos é renunciarmos
à nossa independência. É nunca mais podermos fazer a política que queremos para
o nosso amado Portugal.
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