Lá por Abril Portugal irá
tomar uma decisão importante: como sair do programa de ajustamento? Fala-se
numa saída airosa à “irlandesa” ou numa saída com um programa cautelar? Neste
momento o pessoal político de serviço e com palco na comunicação social vai
dando exemplos de pura infantilidade quanto ao modo como olham para a questão
já que se limitam a observar o assunto pelos óculos partidários. O pessoal dos
partidos do governo parecem aqueles gestores que só pensam nos resultados
trimestrais, completamente alheios sobre o que verdadeiramente pode fazer mais
sentido para a empresa, e com o pensamento único no bónus trimestral. Avaliam obsessivamente
indicador a indicador com o fito de ganharem pulso para a decisão eleitoralmente
mais conveniente. Do lado da oposição, que deveria ser mais responsável do que
é, torce-se para que as coisas não corram tão bem até lá pelos mesmos motivos eleitorais. A
esquerda radical faz a única coisa que sabe fazer: berrar.
Genericamente todos falam
de acordo com estados de alma sem se socorrerem da incómoda, mas útil, análise
fria e racional. E quando os estados de alma campeiam em matérias tão
importantes, então de ciência certa estamos perante um problema geral de falta de clarividência. Assim, e por saber que esta é melhor servida se colocarmos as
perguntas à frente das respostas, entendo que a classe dirigente prestaria
melhor serviço se fosse mais expedita nas perguntas do que o é nas respostas. Da minha parte
tenho algumas, a saber:
1.
Será que três
anos após o ajustamento o povo português está preparado psicologicamente para
“andar à solta” quando sabemos que o mesmo povo deu luz verde a uma série de
vendedores de ilusões (Cavaco Silva, António Guterres, Durão Barroso, Santana
Lopes, e José Sócrates)?
2.
Sabendo que
já fomos intervencionados por três vezes em 37 anos de democracia, e porque em
democracia queremos viver, será que em três anos ganhámos verdadeiramente, como
povo, consciência que temos que enveredar por outros padrões de comportamento,
outras atitudes, e outras expectativas onde o encontro entre direitos e deveres
sejam mais equilibrados, e as exigências estejam mais de acordo com o que a
economia pode dar?
3.
Sabendo que o
líder do PS e os seus acólitos de serviço são os mesmos que também nos enfiaram
no buraco, sabendo que a sua cartilha não mudou, sabendo que ainda não
perceberam que a sociedade portuguesa e o seu modo de vida teria de mudar, será
que é razoável correr o risco de deixar o povo português entregue, ainda que
parcialmente, a pessoas completamente fora da realidade e sem a mínima noção
que com poder nas mãos irão praticar actos irresponsáveis?
4.
Sabendo ainda
que temos na direita portuguesa um ministro da economia que ainda pensa que o
consumo interno tem que ser estimulado, sabendo que não está só, a avaliar
pelos subscritores da sua moção de Junho de 2013 (e a macro economia não muda
muito em seis meses ou um ano, e se não viam nessa altura que a economia estava
a mudar, então não podem ocupar cargos no Ministério da Economia), será que
isto não é matéria que dê que pensar sobre as alternativas que temos à direita
que nos façam acreditar que alcançaremos excedentes crónicos na balança com o
exterior nas próximas décadas?
5.
Sabendo que o
barco anda fortemente adornado à esquerda, será razoável pensar que poderemos
no futuro próximo correr o risco de incumprimento, reescalonamento da dívida,
perdão parcial, ou outro mecanismo de perda para os credores?
6.
Sabendo que
temos historicamente elites fracas e uma sociedade que dá 10 vezes mais ouvidos
à voz irresponsável do que à voz responsável (a começar pela comunicação
social), sabendo que a sociedade ainda não é suficientemente exportadora que
nos dê aquele sentido de maioridade que nos faça perceber que o sucesso depende
de nós e do esforço colectivo, será que estamos preparados para sozinhos
pensarmos sobre o que melhor nos convém?
7.
Sabendo ainda
que a capitalização das nossas empresas é insuficiente, sabendo que esta
parcela do ajustamento é muito importante e que ainda está longe de ser feita,
sabendo que este processo demora muito mais tempo a levar a cabo, será que é
razoável deixarmos a nossa banca desprotegida com todas as implicações que isso
possa ter em termos macro económicos e consequentemente ao nível dos juros que
nos são exigidos?
8.
Sabendo que a
reforma do Estado foi deixada formalmente para o fim desta legislatura, quando
deveria na práctica ter sido uma das primeiras prioridades, sabendo que nenhum
político da esquerda à direita quer essa batata quente, será que estamos em
condições de sozinhos, enquanto povo, de enfrentar os interesses instalados na
função pública e assim permitir melhorar a produtividade dos serviços públicos?
9.
Sabendo que a
questão da sustentabilidade da Segurança Social é um tema incontornável,
sabendo do sarilho demográfico que temos com todas as implicações no sistema,
sabendo que necessitamos de um plano mais sustentável de financiar o sistema
e/ou de reduzir os encargos actuais, será que sozinhos teremos mais graus de
liberdade para actuar?
Tenho muitas dúvidas que
após três anos a sociedade portuguesa no geral esteja em condições de viver sem
a ajuda muito próxima dos nossos parceiros. Três anos não são suficientes para
um povo se consciencializar das asneiras cometidas e, consequentemente, de uma
maneira sólida, dar continuidade aos novos comportamentos que entretanto foi
assumindo, nomeadamente se lhe aparecer pela frente um novo vendilhão de
ilusões. E tão pouco três anos são suficientes para que uma classe dirigente
menor perceba que o jogo como era jogado acabou de vez, em vez de pensar que o
que ocorreu foi um intervalo um pouco mais prolongado e que está na altura de
voltar a entrar em campo. Portugal, embora em recuperação, ainda apresenta
muitos sintomas de que pode de novo vacilar se for deixado à sua sorte. Um bom
decisor político olha a estes aspectos e coloca a si mesmo e aos seus
conselheiros perguntas da natureza como as que acima enumerei.
Sou daqueles que sinto
vergonha por termos seguido desde há muitos anos um caminho que só poderia
acabar na perda da nossa independência. Quero, tanto quanto os mais revoltados,
recuperar a soberania que perdemos. Mas há uma outra coisa que quero, ou
melhor, exijo. Exijo que seja poupado ao vexame de ver novamente Portugal
trilhar um caminho que leve a prazo a mais resgates, ou eternamente mendigar
junto aos seus parceiros. Isso seria indigno e um péssimo legado para as
gerações futuras.
Não sei em rigor se será
melhor apelarmos a um programa cautelar ou a um segundo resgate com a mesma
duração. Sei que a palavra resgate tem um cunho depreciativo, mas também sei
que melhorámos muito desde que a Troika está em Portugal, e tendo em conta o
acima exposto, sinto que Portugal ficaria muito mais bem servido se o programa
de resgate fosse estendido por mais três anos, até porque seguramente
pagaríamos juros mais baixos em comparação com a taxa de juro associada a um
programa cautelar. Acredito que muitos, nomeadamente alguma classe dirigente,
não goste da opção, mas sei que esses são os mesmos que andaram bem casados com
o sistema anteriormente em vigor e que nos levou ao resgate. Aliás, à
semelhança do pessoal da sindicância. Sei também que aquele Portugal em que
acredito, o Portugal que exporta e que luta no campeonato da Globalização, é
aquele que não vejo berrar contra a Troika. E este Portugal precisa de mais
tempo para marcar o ritmo com que vamos ter de passar a viver em Portugal.
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