sábado, 13 de junho de 2015

Acham-se

A Portugal foi permitido testemunhar desde Julho do ano passado ao desmoronar do maior castelo de cartas da nossa economia e finanças. Falo do GES/BES e da PT. A derrocada em si é desprezível em termos de impacto para a economia real, que é ínfima se atendermos ao quase pavor que nos quiseram vender por quem de perto convivia com o desmoronar das ilusões. O que não é desprezível é a análise do modelo em que o sistema estava montado no que respeita ao modus operandi e às crenças de quem habitava no círculo e de quem dele beneficiava directa ou indirectamente.
Esse grupo falido continha muito daquilo que marcou Portugal nos últimos 40 anos. O pensar que se é mais do que aquilo que se é, a prostituição intelectual das chefias ao subjugarem a ética aos proveitos financeiros e à carreira, o agachamento da vulgata corte por troca de dividendos e outros pequenos “benefícios”, e a suprema ilusão de todos os participantes e aspirantes a participar de que funcionar em circuito fechado é condição de sucesso desde que para isso se socorra de conhecimentos interesseiros e outras influências.
Como em qualquer sistema dominante que se desenvolve em circuito fechado, as vozes que nele habitam e de que dele beneficiam acham-se a voz, ou seja, acham-se possuidores de autoridade absoluta na emissão de doutrina sobre os credos, trilhos, e ritmos que todos devem seguir. Consequentemente, e com o passar do tempo, os enviesados modelos de sucesso deste circuito fechado passam a ser o modelo único e rígido dos que dele fazem parte, ou anseiam fazer, e dos que dele beneficiam, com todas as nefastas consequências para a ética e sanidade mínima que devem caracterizar as organizações de sucesso. As tristes figuras na comissão parlamentar dos participantes máximos da ilusão mais não fez do que colocar a nu a qualidade do barro sobre o qual todo o sistema estava edificado e a consequente podridão da seita, e que de certa forma modelizava o conceito nacional de sucesso, explicando em boa parte de uma forma fria e literal porque Portugal não se desenvolveu muito nos último 20 anos.
É um facto inequívoco que nos dias de hoje as palavras e os discursos dos executivos de topo em Portugal são muito mais esmiuçados. Por sorte, a rapaziada (a expressão não é gratuita pois a infantilidade é característica nestes sistemas fechados) que funciona em circuito fechado ou já se extinguiu, ou a pouca que ainda sobra perdeu a motivação de expor a sua vacuidade a escrutínios mais severos. Muito proveito Portugal irá beneficiar a prazo, pois quem hoje marca o ritmo funciona tendencialmente em circuito aberto, ambiente que por definição tende a retirar o melhor de cada participante do sistema.
Há no entanto ainda um domínio que funciona basicamente em circuito fechado: os partidos. O que explica porque as maiores alarvidades que ecoam pelo país sejam maioritariamente vociferadas por altos dirigentes partidários, de A a Z. Os mercados, com todas as suas imperfeições, a seu tempo sempre vão derrubando as organizações mais podres por via das regras do próprio mercado. Na política criaram-se outras regras, misteriosas para quem joga o jogo pelo jogo, mas vantajosas para quem delas se utiliza para se movimentar como modo último de sobrevivência, tornando a regeneração partidária um fenómeno mais complexo. Os que “acham-se” na política nos dias de hoje e que blindaram o sistema que lhes serve e que lhes permite proferirem estupidez e ignorância, estão para a política como para a economia e finanças estiveram os que fizeram triste figura na Comissão Parlamentar do caso GES. Esses são aqueles que é preciso extrair da política para que Portugal possa respirar melhor e viver num ambiente mais arejado.

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