As prateleiras das livrarias estão repletas de livros pré-fabricados,
bestas céleres (na brilhante expressão de Alexandre O’neill) escritas com o
único objectivo de atingir tops de vendas. O resto é literatura, mas essa tem
quase sempre pouco espaço, uma vez que, na maioria dos casos, qualidade
literária não é sinónimo de sucesso comercial. A propósito disso, Mo Yan, o
vencedor do Prémio Nobel da Literatura deste ano, tem apenas um livro publicado
em Portugal e este não só não está em nenhuma livraria como ninguém sabe se o
livro está guardado em algum armazém ou se foi reduzido a pasta de papel. Mas
agora, com a notoriedade do prémio, vão surgir novas edições e a cara nunca
antes vista de Mo Yan vai invadir os escaparates e os mostruários das
exposições livreiras. Com efeito, os prémios e galardões atribuídos por
academias de intelectuais são da maior importância para o leitor-tipo
português: crédulo, simplório e incauto.
A ironia disto tudo reside no seguinte: até pode ser que Mo Yan seja
um grande escritor, mas distinções destas são o que menos interessa ao leitor
de literatura séria (chamemos-lhe assim). E mais: deliberações globais como
esta têm sempre um programa político adjacente. Neste caso a lógica dos suecos
é estranha, uma vez que Mo Yan é considerado um autor não independente,
alinhado com o regime chinês e dissociado das lutas políticas. Como a Europa
precisa de exportar para a China, talvez o prémio seja uma espécie de bajulação
ao Governo Chinês. Estou a supor, mas o que eu sei de certeza é que o prémio
não é um acórdão ou uma jurisprudência de qualidade literária.
O Prémio Nobel, no fundo, é sobretudo um pilar do mercantilismo
cultural, apoiado em critérios que nem sempre são literários. Houve sete suecos que
ganharam o prémio: Tomas Tranströmmer, Harry Martinson, Eyvind Johnson, Pär
Lagerkvist, Erik Axel Karlfeldt, Verner von Heidenstam e Selma Lagerlöf. Sem
argumentos para a distinção ficaram James Joyce, Jorge Luis Borges, Franz
Kafka, Lev Tolstoi, Vladimir Nabokov, Marcel Proust, Julio Cortazar e muitos
mais. Está bem, está. Boa graça. A realidade é que o
Prémio Nobel não passa de uma curiosidade pitoresca no meio literário.
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