quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Porquê dizer sim às obrigações europeias e o que fazer?

A zona Euro anda em polvorosa com a gestão das dívidas soberanas. Existem países com elevadas dívidas, nomeadamente os do sul, mas não só, já que temos a Bélgica e a Irlanda como belíssimos pontas de lança a representar-nos lá em cima. Evidentemente teremos que controlar a situação. Digo “teremos” porque tenho um genuíno sentimento de que se trata de um problema Europeu, nomeadamente dos países pertencentes à zona Euro. Em termos da moeda “Euro”, sobressalta-me tanto os juros da Bélgica ou Itália subirem (mercado secundário e novas emissões de dívida) para estes países como para Portugal. Simplesmente porque isso afecta o clube a que o meu país pertence. E eu não gosto que os membros do meu clube sejam fustigados, quer seja por uma questão de princípio quer seja por uma questão de interesse próprio, pois que problemas de dívida de um estado membro prejudicam os outros estados membros (ninguém questionará este facto).

Em termos monetários parece inequívoco que existe um denominador comum a todos os países da zona Euro. E esse denominador é a moeda EURO. Ora existindo um problema de sobre endividamento de muitos países desta zona impossível de ser resolvido individualmente, caberá à própria zona em si resolver o problema que se lhe coloca. A não observância deste facto implica a implosão do clube do Euro. E isso é coisa que certamente não queremos experimentar.

Como já deve ser óbvio para quase todos, a solução do problema parte de uma boa resposta política, não uma resposta financeira. Simplesmente os mercados de dívida neste momento não andam a funcionar adequadamente. É bom lembrar que um dos factores fundamentais para o funcionamento dos mercados é a possibilidade de estes terem tempo para processar a informação que vai chegando e como essa informação afecta a realidade em que opera. E dada a natureza complexa do sobre endividamento da zona Euro, do tempo necessário para a estabilização do mesmo, e da dependência política, quer particular à capacidade política de cada país, quer entre países e as instituições internacionais (CE, ECB, FMI, etc), os mercados não conseguem processar a informação que lhe vai chegando. E como tal os mercados ficam órfãos, pois ao esperarem por informação conducente a soluções, ou ela não chega, ou se chega é errante e sem direcção. E mercados deixados ao acaso são como lenha seca e pinhas empilhadas para pirómanos munidos com muito lume.

A resposta política tem que, obrigatoriamente, satisfazer as seguintes condições:

1. Eliminar o cenário de risco sistémico, ou seja, o desmembramento da zona Euro

2. Garantir o financiamento no curto prazo, e refinanciamento da dívida corrente no médio longo prazo a taxas reduzidas.

3. Garantir que os países com problemas corrijam a rota que os levou ao sobre endividamento e que iniciem o processo de amortização de dívida

4. Garantir que para a zona Euro os países com baixos níveis de dívida até à data não paguem pelos excessos dos países com excesso de dívida.

5. E por fim, embora possa parecer óbvio, explicar tudo muito bem aos Europeus

Estas condições são praticamente impossíveis de satisfazer se o mercado for chamado a regular todo o processo. Simplesmente porque as altíssimas taxas de juro em vigor minam a viabilidade deste longo processo de desendividamento .

Neste momento já existem sinais mais que suficientes para que os países receosos de serem chamados a pagar os dislates dos sobre endividados confiem na vontade política destes. Ou não serão as políticas duríssimas em curso em todos eles um sinal mais do que suficients da seriedade com que se anda a tratar a questão? E não será também a aceitação de monitorização externa por parte elementos de organismos internacionais (ECB, FMI, etc) da prossecução de planos financeiros em curso uma prova de que existem motivos para se estar confiante? E se necessário poder-se-á ir até mais além, como por exemplo confiar a gestão financeira desses países a instituições internacionais (ECB ou outra qualquer). Literalmente os países em falta passarem a ser obrigados a subcontratar o ministério das finanças ao ECB durante um período de tempo.

É bom que os países da zona Euro sem problemas orçamentais entendam que a não resolução do problema criará no médio prazo (senão no curto…) disfunções que conduzirão a uma situação com consequências muito piores quando comparadas com aquilo que de momento receiam perder pela opção de uma solução conjunta. Ainda que por acaso tivessem fundamento os seus receios, mais vale assumir agora que o erro consistiu no pecado original, a criação e sua adesão ao Euro, do que ficar a assistir passivamente a um movimento desordenado de implosão do Euro.

Parece-nos que é chegado o momento de os países sem problemas de sobre endividamento perceberem que vale a pena explorar um mecanismo conjunto de emissão de dívida que em muito ajudaria a resolver a situação sem que isso implique que existam doações forçadas para os países sobre endividados. E a emissão de Eurobonds até um certo limite pode resolver a questão.

A lógica de um plano para emissão de Eurobonds deverá constar de:

Permissas:

1. Os países da zona Euro devem caminhar para um limite máximo de endividamento de 60% do PIB

2. Os défices em função do PIB para cada país não poderão exceder a taxa de crescimento do produto e estarão sempre limitados a 3% deste. Este critério só é válido para os casos em que a dívida total seja inferior a 50% do PIB. Se assim não for não poderá existir défice.

Isto não é novo mas é conveniente estar bem visível no radar.

Lógica:

1. Os Eurobonds deverão ser emitidos até 40% do PIB dos países da zona Euro

2. Acima dessa percentagem cada país é responsável pela sua própria emissão sujeitando-se às taxas exigida pelo mercado

3. Para ambas as situações poderão os residentes particulares dos países da zona Euro concorrer às emissões do mercado de dívida

Período de transição:

O período de transição é crucial para o funcionamento do novo sistema. O processo deverá ser executado de forma gradual. Para tal, a dívida a vencer de cada país membro seria substituída inicialmente pelas Eurobonds dando tempo assim ao mercado (alguns anos) e viabilizando um processo de estabilização destes evitando assim estarem ao sabor dos ventos e inviabilizando o mecanismo dos mesmos criarem vida e dinâmicas próprias. Os Eurobonds seriam colocados inicialmente a uma taxa fixa (por exemplo, 2,5%) e o ECB serviria de sindicato comprando toda a dívida não colocada no mercado. Ou seja, o mercado primário pelo sistema de leilões não funcionaria por um período de 3 a 5 anos.

À medida que os Eurobonds atingissem os 40% do PIB de cada país já alguns anos se teriam passado e já os mercados estariam bem mais calmos. Nesta fase já seriam visíveis os efeitos dos ajustamentos em curso (austeridade, desalavancagens financeiras, etc) nos países com problemas orçamentais. Por outro lado os mercados não seriam mais brindados pela constante demonstração de desentendimento entre os membros dos países da zona Euro, o que só por si serviria de factor de confiança.

Os países sob intervenção internacional só entrariam no esquema após finda a intervenção. As intervenções só deverão ser consideradas finalizadas quando esses países apresentassem excedentes orçamentais por dois anos consecutivos (independentemente da taxa de crescimento do PIB). Paralelamente os mecanismos de controlo sobre os países intervencionados deveriam ser aumentados de modo a fornecer garantias ao processo de ajustamento global.

Passados esses 3 a 5 anos já o mercado estaria em muito melhor situação de processar a informação acumulada durante este período, nomeadamente

• Da vontade dos países periféricos procederem aos ajustamentos necessários e avaliação dos seus resultados

• Da capacidade política dos países da zona Euro na implementação de um sistema de emissão de dívida dentro dos parâmetros normais de funcionamento

• Da viabilidade da zona Euro enquanto espaço de moeda comum

Chegou o momento da zona Euro perceber que o jogo tal e qual ele decorre é muito perigoso. Uma moeda única não pode ficar ao sabor de políticas individuais dos seus constituintes e refém das consequências nefastas da inabilidade dos políticos de serviço de cada país. O que está em causa é demasiado grande. Foi doce o momento que se tem vivido desde 1998, pois colheram-se os benefícios de uma moeda única sem se sentir que isso implica a renúncia de alguma coisa. Chegou o momento de termos a humildade de aceitar o que há a renunciar e de ter a clarividência de que o saldo final é ainda muito positivo.

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