quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Disrupções ou evoluções

O país está numa situação complicada. Nestes momentos surgem sempre vozes a reclamar rupturas. As rupturas sempre existiram na história mas não creio que neste momento precisemos de uma grande ruptura. Não há memória de existirem grandes rupturas nas democracias. As democracias por serem sistemas abertos funcionam em sistema de feedback, com o contínuo reprocessamento da nova informação recolhida. Por isso as mudanças neste momento em Portugal tendem a ser evolutivas e não disruptivas.

Nós tivemos uma irrupção que foi o 25 de Abril. Mas o 25 de Abril não chegou a tudo, pelo que julgo faltar estender o 25 de Abril aonde ele não chegou. Mas por vivermos em democracia essa extensão será feita por processos evolutivos. Neste ponto notemos que o processo pode ser mais ou menos rápido (embora demasidos atrasos possam gerar distúrbios). Os temas mais complicados que temos em Portugal são, e por ordem crescente de dificuldade de resolução:

1. A tendência para, de uma forma ou de outra, quem está no governo querer controlar os meios de informação em seu favor
2. A relação paternalista e despótica do estado com o cidadão
3. A ideia de que o estado resolve todos os problemas
4. A responsabilização das pessoas
5. A escassa e restrita noção de que para que serve o poder
6. A Justiça

Para solucionar o primeiro ponto é simples. É não tocar de nehuma forma nos órgãos de informação e especialmente nos seus conteúdos, tão pouco veicular que quem está em desacordo é penalizado. Ponto final. Portanto é só uma questão de atitude. Este ponto é de fácil resolução. Erradicar a influência dos governos nos meios de comunicação é muito importante pois a Liberdade ainda é um conceito não totalmente interiorizado no nosso sangue e comportamento.

O segundo ponto pode ser alcançado aplicando ao estado as mesmas regras que este aplica ao cidadão. E como isto depende em exclusivo do estado é também razoável pensar que este ponto se resolve com alguma facilidade. O caso dos juros de mora é o melhor exemplo. A colocação central de professores é outro exemplo e revela uma patologia única. Questiono-me se na Coreia do Norte haverá qualquer sistema do género.

No terceiro ponto apostaria no cheque educação como medida para desmistificar o estado como o garante de tudo quanto há ou possa haver. Obviamente há pontos onde o estado deve estar totalmente e os privados não podem responder de forma alguma (penso ser o caso, entre outros, da defesa e da justiça). Implementar o cheque educação deve ser tarefa de mediana complexidade.

O quarto ponto teria uma bela assistência do terceiro. Mas depende em muito do último. Não acredito que um povo seja por natureza irresponsável. Antes acredito que maus sistemas tornem as pessoas menos responsáveis.

O quinto ponto é complicado pois implica mudar radicalmente as expectativas de quem montou arrais nos partidos. E decretar a mudança das aspirações das pessoas não é das coisas mais exequíveis. Podemos trabalhar o tema de modo a tentar empurrar pessoas de idoneidade e formação pessoal mais recomendável para dentro dos partidos. Não sei se isso é possível de ser feito com rapidez tendo em conta que muitos dos que lá estão não disponíveis para oferecer a melhor colaboração.

O sexto ponto é o diabo. Não faço bem ideia do que é preciso para resolver este imbróglio. Soa-me que a desorganização deve ser tremenda, a falta der liderança e produtividade deve ser gritante, mas não sei bem como ultrapassar o problema. Ocorreu-me chamar outra gente, talvez uns altos e loiros, para a gestão da organização da justiça. Mas onde isto parece cor-de-rosa pode à posteriori revelar-se uma asneira... ou talvez não.

Penso que se resolvermos estes 6 pontos damos passos enormes na construção de um país muito melhor. Estes 6 pontos estão na génese de outros dois males não tão visíveis, e que são também muito perniciosos: a excessiva dificuldade de muitos dos mais capazes sairem vitoriosos, e a falta de discriminação positiva ao nível do rendimento para as pessoas de maior produtividade. A recente emigração de muitos licenciados é o espelho desta realidade.

Os 6 pontos acima listados associados ao descrito no parágrafo anterior são deterioradores da confiança de um povo. Um povo necessita de esperança, e a esperança necessita da confiança.

A confiança pública não se decreta e tão pouco se possui por pensarmos tê-la. Não está em nós, está antes fora de nós, está na sociedade. O que cada um possui é auto-estima e confiança privada, conceitos que se confunde com confiança pública. A confiança de que Portugal precisa é da confiança pública, a que resulta do suor da nossa sociedade, o que dela é emanado pela forma como esta é construída, dos relacionamentos estabelecidos entre os seus organismos, da matéria de que é feita os seus elementos mais proeminentes e dos que se encontram em posições de destaque. A confiança de que os políticos geralmente falam é a que resulta das relações de cada um com aquilo que lhe é mais próximo. Esta é a confiança privada, conceito do foro individual onde o estado não tem que se meter directamente, e que depende, para além da confiança pública, da auto-estima individual.

Os políticos da nova era, carregados de agendas pessoais e ansiosos por crescerem através das fórmulas que eles próprios criaram, vão jogando o jogo individual da sua casta. O sucesso deste jogo, na forma como ele está concebido, pressupõe a inversão de prioridades, com o indivíduo a sobrepor-se ao grupo e este à sociedade, gradação que Rousseau diz ser contrária àquela que deveria ser adoptada. Deste jogo resulta que para ter sucesso o poder deve ser utilizado em conformidade com a hierarquia das prioridades: 1. Eu, 2. Grupo, 3. Sociedade. Os vencedores deste jogo, satisfeitos com o bem que a si podem reservar pelo facto do poder que detêm, e com confiança (privada), sentem-se agora impelidos a exportar para o Grupo e para a Sociedade a única fórmula que reconhecem ser a de sucesso para alcançar a Confiança, ou seja, a sua, e que, pela natureza das coisas dá a pior das assistências à confiança pública.

É no tipo de intérprete da acção governativa que se encontra a impossibilidade de lutar contra os 6 males listados (e o que dele é derivado e que atrás mencionei). Compete-nos extrair esse tipo de intérprete que mina a confiança pública da nossa sociedade e que não permite a produção de ideia para o nosso povo. E povo falho no pensamento e sem rumo está condenado à lamúria e resmunguice.

Não sou favorável a grandes mudanças radicais. Sou dos que pensa que as mudanças na orgânica, funcionamento líderes de um país podem ocorrer de forma pensada, planeada e faseada. No pressuposto de que tenho razão, acho que isso pode marcar standards comportamentais para o resto da sociedade e assim servir de pedagogia para a governação de outras organizações da sociedade (desde empresas, famílias, etc.). Creio que este tópico não é académico. Já outros o fizeram pelo que temos a tarefa facilitada. Está somente nas nossas mãos.

Um comentário:

tété disse...

Finalmente não tenho que ver os debates, nem ler os comentários no dia seguintes dos jornáis, televisões ou cibernéticas. Fico satisfeita com o teu resumo e espero que tenha sido assim. "A propos" já viste a nova sede do BE?!!! O menino do liceu françês trata-se bem ao abrigo de uma alegada partilha de cultura.
ehehehehehehe

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