TERÇA-FEIRA, 22 DE FEVEREIRO DE 2011
Tenho notado amiúde que a maioria dos Portugueses com quem vou contactando, reagem com muito pouca maturidade ao facto de terem que baixar de nível de vida. Com frequência dizem que não é possível que as coisas fiquem pior do que o que já estão e que não é mais possível apertar o cinto. Como se a realidade fosse função dos julgamentos. A realidade é muito poderosa e está para além das nossas opiniões ou estados de alma sobre a justiça da forma como essa realidade nos é apresentada.
É crucial para a viragem de Portugal para um novo rumo que os Portugueses interiorizem a realidade. Esta não se confina aos seus efeitos. Eles são muito bem conhecidos, porque funestos e porque a todos toca de uma maneira geral. Os Portugueses estão muito bem familiarizados com os sintomas do mal, mas estão incapazes de ver a doença, muito menos de a perceber.
A doença de que padecemos chama-se “viver no mundo da ilusão” (por ironia podemos também chamar “viver no mundo dos desenhos animados”). Esta doença pode-se manifestar de inúmeras formas. Entre nós, e neste período histórico, últimos 25 anos, resolveu manifestar-se pela forma de dívida, seja ela pública ou privada, projectos mirabolantes e desfasados da realidade (TGV e NAL), pela ideia peregrina que o sucesso económico de um país passa por talhar uma maior parte do orçamento por parte dos grupos de pressão, pela defesa de agendas absurdas e mórbidas (aborto, casamento homossexual), e acima de tudo por uma vontade impressionante de recusar ouvir a palavra pela mão do argumento, preferindo, ao invés, o berro e a mentira.
Enquanto não entendermos que este o mundo da ilusão já acabou e que quanto mais rapidamente nos atirarmos para o outro, ou seja, aquele chamado “Realidade”, sentiremos eternamente os sintomas funestos da doença, e não estaremos em condições de resolver o problema. Como para a maioria das doenças, existem diversas terapias que resultam em diferentes prescrições. Sejam elas quais forem, estas demonstram ser particularmente duras quando comparadas com os comportamentos que conduziram à doença. Prescrever a um comilão incontinente por doces que os deixe de comer em resultado de turbulências graves de fígado, não é mudança comportamental fácil de seguir. A compensação do comilão é que o sucesso da prescrição resultará no fim das suas turbulências figadais. Certo é, no entanto, que até lá coabitarão duas penas, a interrupção da ingestão dos doces e as ditas turbulências de fígado, pelo que, e no início, o caminho pode provar ser mais difícil do que aquele que levou o comilão à consulta médica.
Portugal e os Portugueses não querem, pura e simplesmente, ir ao médico. Ao invés de quererem ouvir da doença de que padecem e de aceitar uma prescrição, seja ela qual for, preferem manter-se ligados ao vício e ao erro, ainda que para isso sofram pesadamente, e cada vez mais, com os sintomas do mal (juros altos pela emissão de dívida, fraca competitividade, desconfiança dos mercados, desânimo geral, e falta de confiança no futuro).
Como para algumas doenças, o mais difícil é aceitar a realidade e o facto de que o início da cura pode ser mais penoso do que até aí têm sido os sintomas da doença. Por isso, e antes de apresentar uma prescrição a Portugal, importa bastante dizer aos Portugueses que tipo de doença assola Portugal. Só depois vale a pena começar a indicar prescrições.
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