quinta-feira, 27 de outubro de 2011

O socialismo em Portugal acabou

QUINTA-FEIRA, 21 DE OUTUBRO DE 2010

Portugal neste momento anda a dar os últimos tiros de socialismo. O socialismo em Portugal começou, e bem, no pós 25 de Abril. A grande maioria da população vivia numa pobreza material difícil de imaginar pelos padrões de hoje. Grandes saltos nos serviços de saúde e protecção social foram dados a partir desse momento. Só não o vê quem se recusa a ver.

Ainda nos primórdios, e após as crianças terem andado pelo poder entre 74 e 76, um governo socialista, o primeiro governo de Mário Soares, tratou de pôr a casa na ordem com a ajuda do FMI. O mesmo Mário Soares na companhia do FMI aplicou receita semelhante nos anos de 84 a 85 depois do desastroso governo da AD de Pinto Balsemão. Até 1985 o socialismo cumpriu, e bem, o seu dever. Lutou pela democracia, teve cuidado com as contas públicas, e aumentou os serviços de saúde e protecção social.

O descalabro veio a partir de 1986. O PSD, que entendo ser um partido socialista vestido de cor-de-laranja, tratou de inchar o sector público para além daquilo que a economia o permitia. O pequeno abalo da crise de 92/93 mais não foi do que uma pequena interrupção da tendência socializante que tomava conta de Portugal. A dívida pública em 1995 estava no entanto ainda a níveis aceitáveis, mas os ingredientes para a sua explosão nos anos subsequentes foram bem semeados pela mão do Pai do Monstro: Cavaco Silva.

Com a saída do socialista Cavaco e a entrada do socialista Guterres, o monstrozinho construído por Cavaco Silva teve o melhor tutor que alguma vez poderia imaginar. De forma clara outro socialismo tinha chegado e vencido em Portugal, o socialismo corporativo que não vê mais do que o seu próprio umbigo. Longe iam os dias do socialismo responsável de Mário Soares no que respeita a contas públicas*. O que agora campeava era o ditado pelas corporações atulhadas de interesses corporativos e nada dados ao interesse nacional. Foram 15 anos de produção de um modelo que começou a dar sinais de implosão a partir de 2000.

A partir de 2000 até ao momento vive-se o culminar da inviabilidade do modelo socialista irresponsável. Paradoxalmente, ao invés de o Socialismo acabar com velhos decrépitos sentados no poder, o Socialismo resolveu acabar com crianças no poder, como que a revisitar os tempos idos do PREC. Mas desta vez com um aspecto mais polido e vestidos de capitalismo, coisa que em rigor até se trata de algo que nunca entenderam bem o que é. No que respeita a vestimenta, em lugar do vulgar Kispo que compunha uma barba revolucionária, resolveram adoptar fatos de marca que, segundo eles, acompanhavam bem os tempos de afluência aparente resultantes da globalização. Discurso escorreito e desfaçatez de fazer corar o maior aldrabão de bairro destoava do pacote visual, mas segundo a cartilha do momento isso era coisa aceitável. Assim foi o culminar de uma era, que aceitando tudo e todos até se dignou de atropelar os mais básicos valores da vida e valores da vida em sociedade, tais como a legalização do aborto até às 12 semanas (salvo erro, não sei ao certo) e o patético casamento de pessoas do mesmo sexo. A todo este pacote visual a tresandar de vacuidade chamaram-lhe “modernidade”. Sim, onde já vai o socialismo…

Agora que a realidade se anda a tornar mais visível e a água e o azeite tomam os seus lugares, o ambiente turvo e meio esquisito em que vivíamos apresenta-se-nos agora tenebroso. A tomada de consciência de que o caminho trilhado foi o errado durante demasiado tempo faz-nos sofrer só de pensar que serão necessárias talvez mais do que uma geração para fazer de Portugal outra vez um País normal e responsável, e não um País dividido entre os que trabalham em coisas que o mercado quer e os que vivem à conta do outros, quer não trabalhando, quer fazendo coisas que o mercado não quer, ou quer ainda fazendo coisas que não são de todo necessárias. Tudo isto no meio de uma justiça que não funciona, de uma segurança que foi substituída pela falta dela, e de valores sociais algo trucidados. Assim, há como que um sentimento de que a sociedade está desconjuntada.

Não duvidemos que o socialismo acabou em Portugal. Já não há mais uma democracia para implementar ou socialistas com o calibre de Mário Soares para enfrentar um desastre de contas públicas. O que há para tratar é de construir um modelo onde os responsáveis marquem o ritmo, onde quem trabalha e é trabalhador é premiado, onde o empata e o que vive à conta dos outros é colocado no seu devido lugar, onde a justiça funciona, onde falta dela volta a ser segurança, onde o empreendedor se liberte e seja estimado, onde o inovador, o afoito, e o intuitivo sejam empurrados para a frente, onde a imaginação não seja travada pela burocracia, e onde as corporações levem um valente pontapé no rabo. Para tudo isto não precisamos de socialismo para nada. Deste travestido de sei lá o quê, ou do antigo, ainda que fosse liderado por um Mário Soares.

* Não incluo aqui o infeliz episódio da descolonização para não desviar o foco do post.

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