quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Quanto tempo demora esta fase de transferência e como a mesma se irá processar?

DOMINGO, 6 DE MARÇO DE 2011

Esta é a pergunta que se coloca sobre Portugal neste momento. Valerá a pena debruçarmo-nos sobre a pergunta e tentar perceber o que ela encerra. Primeiro temos a questão da “transferência”. Transferência de quê? Basicamente trata-se de uma transferência de uma sociedade voltada para o consumo para uma sociedade voltada para a produção, revertendo as proporções em favor da segunda de modo a compensar os excessos da primeira nestes últimos 25 anos.

Este processo será, em princípio, longo e penoso. Direi que durará uns 30 anos. Montar uma economia voltada para a exportação não é coisa fácil. Mesmo que contemos com a vontade dos Portugueses para o efeito, coisa que não está garantida, temos ainda que contar com a concorrência internacional, ou seja, com todos os outros povos com vontade, e capacidade, reforço, capacidade, de jogar o campeonato da produção.

A vontade dos Portugueses é algo que não está a ser devidamente equacionada. Aliás, este é um fenómeno sobre o qual me assaltam dúvidas de como se processará. Como lidar com a questão das expectativas e a sua adequação à realidade de cada um? Como irá reagir alguém que até agora tinha como expectativas ser servido e trabalhar em ambiente palaciano voltado para o consumo (seja assistente de marketing de produtos de consumo, vendedor de automóveis, funcionário/a público, etc), e que irá passar no futuro a ter de servir e ter de trabalhar em serviços que até agora constituíam o suporte do seu estilo de vida (seja trabalhar numa empresa de limpezas, a tratar de pessoas idosas, num shop-floor de uma fábrica, ou ainda na agricultura e pescas)? Esta questão fará as delícias dos sociólogos daqui a 40 anos, da mesma maneira que os actuais se derretem a analisar / comparar o Portugal de 1960 com o de 2010.

Enquanto para o parágrafo anterior podemos contar com o argumento da "Realidade", essa coisa poderosíssima que tratará de dobrar as pessoas, confesso que já me assusta mais a nossa capacidade competitiva. É que teremos mais concorrentes no mercado (agora de todos os continentes), com mais capacidades do que pensamos, e mais dispostos a receberem aquilo que por cá é considerado indigno e ímpio (uma questão de expectativas) se isso os colocar sentados à mesa do campeonato mundial.

Quanto à forma de como a transferência se irá processar isso é algo de difícil previsão. Idealmente será feita dentro da zona euro de modo a evitar catástrofes de curto prazo. Mas nada nos garantirá de que não sejamos empurrados para fora do Euro se a isso convier ao resto dos países da zona euro. Desta possibilidade depende o quanto o povo Português consegue apreender a situação em que se encontra e aceitar as prescrições que se impõem, e que, repito, passam por fiscalmente desincentivar tudo o que respeite o consumo e incentivar tudo o que respeite produção (o seu decorrente acréscimo passa pelo sucesso que os empreendimentos tenham no concorrencial ambiente internacional).

É pouco percebido pela população de que o facto de estarmos na zona euro e atulhados em dívida nos impossibilita de enveredar por soluções como as que adoptámos em 1977/78 e 1983/84 aquando dos acordos com o FMI. Proceder a desvalorizações da moeda e a perdas de poder de compra ao nível dos 10% é coisa que não é possível beneficiar estando na zona euro com o nível de endividamento que temos. Assim sendo a solução é única, penalizando fiscalmente o consumo e estimulando em paralelo a produção, não só por via fiscal, bem como onde o Estado pode concorrer para o decréscimo dos custos de produção / contexto. A dúvida reside somente no grau em que se decide servir a solução.

Curiosamente há um factor que parece assustar a maioria dos nossos opinion makers e que me parece não ser tão importante. Trata-se da necessidade de existir um acordo de regime ou de existir um governo de maioria absoluta de modo a garantir estabilidade (referem eles). Ora, ainda que havendo um governo minoritário, nenhuma oposição será suficientemente louca para tomar posições que coloquem Portugal fora do Euro. BE e PCP incluídos. Sei que a rota em que nos encontramos nos colocará, a prazo, fora da zona Euro. Mas esse espectro ainda não entrou na equação dos sindicatos e partidos de esquerda, coisa que irá acontecer daqui a uns 2 anos. Forças sensíveis a braços de ferro e pouco dadas ao valor do argumento, estes partidos não hesitarão em mudar de opinião se Portugal for confrontado com um ultimato Alemão. Berrarão contra o Prussiano, mas não vacilarão em comportar-se em conformidade. O mesmo se passará com as outras forças políticas. Caberá ao partido que formar governo (e eu espero que seja o CDS) colocar a questão muito abertamente aos Portugueses de modo a condicionar de vez a decisão de todos os outros partidos no que respeita à passagem dos orçamentos de Estado que adoptem as medidas adequadas.

Não nos devemos assustar. As fases de mudanças de regime são coisas normais. O regime ditatorial que tivemos acabou em 1974 porque tinha de acabar. Não era mais possível continuar com ele. Apodreceu e desabou. O mesmo se passou nos países de Leste há cerca de 22 anos. Ruíram que nem um castelinho de cartas. E o mesmo se vai passar em Portugal com o Socialismo que nos governa há 37 anos. Já apodreceu e está para acabar. Mas atenção, ainda não acabou e ainda vai dar mais “tiros”, embora no pé, obviamente. Resta-nos preparar a fase pós-socialista.

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